quinta-feira, 9 de junho de 2011

Ao vivo, direto do parque




Domingo é dia de futebol, pelo menos para uma boa parte dos brasileiros. E domingo é dia de parque para parte dos moradores de Caxias do Sul. Qualquer semelhança é mera coincidência. Mas nem só de futebol se resume o parque Getúlio Vargas, mas de uma comunhão de várias histórias interessantes e rotineiras que lá acontecem


Primeiro tempo. Domingo, dia 15 de maio de 2011. A neblina toma conta do gramado. Céu cinza. A torcida não comparece por causa do tempo ruim. Mesmo assim algumas pessoas sempre vão estar por lá. É o caso dos proprietários da Lancheria do Parque. Salete Kumpfer, 57 anos, conta que trabalha com lancheria há doze anos. Nove deles só no parque. "Dias chuvosos ou no inverno não tem muito movimento", comenta. Logo do lado de dona Salete, estava seu marido, José Kumpfer, 68 anos, que comenta que no local onde está a lancheria antigamente existia um ginásio, o Pedro Carneiro Pereira.
Histórias curiosas existem aos montes, e até histórias trágicas. "Teve uma certa vez, bem de tardezinho, que foi encontrado um homem enforcado numa árvore", conta Salete. Ela afirma que nunca viu nada de assaltos, pelo menos nas redondezas do bar. Nesse momento, entra um jovem na lancheria e pergunta se não vendem comprimidos. Salete logo diz que não vendem essas coisas e pede para ele sair. Antes de sair, olha para o lado e vê o caderno onde estava sendo anotada a conversa com os proprietários. "Me consegue uma folha, te pago se for preciso", implora o jovem. Questionado sobre que fim teria a folha, foi sincero: "É pra fechar um brêu."
Aparentemente, tanto em dias de pouco movimento como em dias que o parque está cheio, esta cena se repete. Mas Salete diz que procura evitar ajudar usuários com seu vicio, e comenta que muitas vezes, depois de consumirem a droga, eles ficam com fome e vem encomodar. Estamos na metade do primeiro tempo e já há suspeitas de dopping. Vamos falar com o juiz.
O posto da Brigada Militar do Parque dos Macaquinhos atende vinte e quatro horas. "Até em dias calmos como um domingo de chuva, é possivel identificar algumas figuras comuns do parque, como alguns andarilhos, por exemplo", fala a policial Elisandra da Silva. E em dias de maior movimentação é possivel identificar as diferentes tribos, como pagodeiros, punks, etc... Quanto a questão do consumo de drogas, a Brigada tem efetuado rondas no local. A ordem é apreender as drogas, e em caso de grande quantidade, o usuário também é preso. Mas a idéia mesmo é tentar prender quem vende, quem fornece. Isso nem sempre ocorre. Falta e o juiz não sinaliza. Deixa o lance continuar. E o público continua fraco, talvez chegue para o segundo tempo.

Tempo técnico

Enquanto isso, algumas pessoas vão fazendo sua tradicional caminhada com os animais de estimação, outras praticando aquela corrida esperta, parecendo não se importar com as condições adversas. Aquecimento. Pode ser que venha novidade por aí. Muito pelo contrário, parece até ser melhor. Menos gente, menos tumulto, mais espaço para exercitar o físico, mais silêncio. "Independente do tempo, venho correr todo domingo de tarde", comenta André Fernandes da Silva, 29 anos.
E o silêncio e a tranquilidade parecem favorecer os corações. Corações apaixonados, encontros amorosos. E também familias inteiras, trazendo uma cervejinha e também o chimarrão. Vão conversando, dando risadas, se divertindo, enquanto vigiam as crianças que brincam ali perto, no parquinho. "É uma pena o tempo estar ruim, mas fazer o que, devemos aproveitar este lugar mesmo assim, estar perto da família é fundamental", afirma o metalúrgico Roberto dos Santos, 39 anos. E o primeiro tempo termina, sem maiores emoções. Será que o sol aparece pro segundo tempo?

Segundo tempo

Domingo, dia 22 de maio de 2011. Agora a situação mudou completamente, o sol apareceu e com ele uma multidão tomando todos os cantos do parque. Grande público nesta tarde para prestigiar este espetáculo da natureza. Segue o jogo. Nos primeiros minutos é possivel identificar vários pais ensinando seus filhos a andar de bicicleta. Ou seja, futuros ciclistas apareceram na jogada. Mas não só ciclistas, jogadores de basquete também. Só que como a quadra está ocupada pela galera que joga um futebolzinho, o jeito é usar a criatividade: um grupo está lá treinando arremessos de três pontos usando como cesta uma das diversas lixeiras espalhadas pelo parque. E perto dali, outro grupo de jovens reunidos ao som de rap e hip hop fazendo performances de dança de rua e improvisando algumas rimas. Pode-se perceber que agora o público, além de maior, é bem variado, todos os estilos, como já havia sido advertido pela arbitragem antes.
Falando em estilo, em outra parte do parque, onde estão as rampas utilizadas pelos adeptos do Skate, não se encontrava nenhum skatista, mas sim jovens que praticavam manobras radicais utilizando-se bicicletas BMX. Acontecia ali a pratica de um esporte chamado Bike Freestyle. E os skatistas, por onde andam? Caminhando pelo parque com seus skates na mão. Aparentemente aproveitando o dia de sol para caminhar. E para paquerar.
Falando em paquerar, namorar novamente é uma boa opção tática para muitas pessoas. Aproveitando uma sombra de uma árvore, pode-se observar um casal se divertindo ao som do violão. Quem toca a música dos Detonautas, O inferno são os outros, cuja letra fala em "sair para ver o sol", é Mauricio Wierich Bento, 31 anos. Ele toca a canção para a namorada, Luzia Sartori, 27 anos, apreciar. Segundo Luzia, estão namorando a uns 4 meses, e é a primeira vez que os dois vem até o parque juntos. Para Mauricio, o parque é o local ideal para encontros apaixonados. "Tem um clima especial, um ar romântico." Mostrando muito entrosamente, os dois protagonizam um lance digno de replay, uma linda jogada.


Patrocínio

E não faltam nem os vendedores. Mas não pense que estamos falando dos vendedores de salgadinho, de cachorro quente, de refrigente. Estamos falando de vendedoras de chips para celular pré-pago. Aproveitando o grande público presente para faturar uma grana extra, Priscila Canalli e Alessandra da Silva, ambas com 25 anos, fazem a venda deste inusitado produto pela bagatela de R$ 1,00. "Aproveitamos onde existem multidões para vender e o parque parece ser o lugar ideal hoje", comenta Priscila. Alessandra diz: "em meia-hora já vendemos 15 chips, a meta é vender 40 cada uma". E o chip, oferecimento da operadora que não é morta, funciona mesmo.
Lilian Luckman, 23 anos, é frequentadora assídua do parque desde os 14 anos. Ela costuma vir ao parque para se reunir com os amigos, para tomar um chimarrão, para conversar e interagir com as pessoas. "Eu adoro dias de sol, quando o dia está legal para poder curtir e aproveitar melhor tudo que o parque tem a oferecer", afirma Lilian. Ela e mais alguns amigos ficam ali sentados, apreciando a natureza, conversando e cantando canções da banda Legião Urbana. De longe, observam em uma das quadras, pessoas disputando partidas de volei de areia. Caxias do sul está cerca de 800 metros acima do nivel do mar, mas mesmo assim, este esporte é um dos mais praticados em tardes de sol no parque.

Não falta emoção no segundo tempo, todos se esforçam ao máximo para fazer a tarde valer a pena, proporcionando um belo espetaculo, cheio de lances bonitos e alguns inovadores. E aos poucos o sol vai saindo, dando lugar a lua. Os refletores não são ligados, apenas algumas luzes espalhadas pelo parque. Vai chegando o final da partida. Nenhuma jogada mais violenta foi observada. E o arbitro ergue o braço. Final de jogo. O caxiense que veio prestigiar e aproveitar este dia sai vitorioso. Obrigado pela audiência. Até a próxima.

Texto retirado diretamente das aulas do Prof. Paulo Ribeiro, que nas palavras do médico, jornalista e escritor Francisco Michelin, é o melhor escritor da Serra Gaúcha. Falei para uma amiga que só publicaria no blog se o resultado fosse bom. Eu gostei do texto, óbvio, por ser meu. Mas como meus amigos e meu professor também gostaram, aí está.

Um comentário:

Lily disse...

eu gostei pra caramba disso tudo!
e que eu possa contribuir para muitos outros ainda né...hehehe
beijo